domingo, 18 de setembro de 2011

D'Aquém: A Madeira de uma Cruz

A blogosfera e o jornalismo, reflectindo a opinião pública portuguesa no geral, sofrem de uma falta de coerência estonteante. De mim não se lerão palavras em defesa daquele estulto senhor que (des)governa a Madeira, mas a crucificação e apedrejamento público a que ele se viu sujeito nos últimos dias têm sido hilariantes. Relembrar o passado recente é exercício mental indispensável à manutenção da coerência nas posições que assumimos. Uma coisa será dizer algo aos 18 e o seu contrário aos 38. Outra bem diferente é ventilarmos a opinião da moda sem o pudor de nos prendermos às convicções que tão acerrimamente defendíamos há três ou quatro anos. É o velho adágio: dois pesos e duas medidas.






"A Madeira é a cruz da República!!" oiço-os brandar histericamente! A Madeira, meus caros, é mais uma acha para uma fogueira já bem viva. Nada tenho contra o apedrejamento político desse senhor. Cada um faz a cama em que se deita. Mas poderia vir cheio de azedume defender o erro actual com os indultos generosamente concedidos a erros semelhantes no passado. E embora muitos chamem a tal exercício o expoente de uma retorcida e balofa retórica, não deixa de ser curioso que essa seja precisamente a base da jurisprudência. Mas não, não vou ser desses.

Mas sou dos que se revolta quando as massas arranjam um bode-expiatório que, na memória colectiva, em pouco tempo se tornará o Diabo na Terra, gerador de todo o pecado e sofrimento lusos. E na cruz em que se há-de pregar este pecador se hão-de redimir os actos e omissões de tantos outros. Mas este, o condenado, não dará em religião. A verdadeira religião e fanatismo será a dos redimidos, cujo advento surgirá dessa celestial Cidade das Luzes e é aguardado por muitos que nestes tempos de trevas jogam pelo Seguro. E envolto nas Luzes da filosofia virá, com infinita sapiência, julgar madeirenses e continentais e o seu Reino não terá fim. Ámen.

Entre o senhor da Madeira e os que por cá, no Continente, se quedaram nos últimos anos, quem de facto se vê crucificado é o contribuinte.

(Na imagem: A Crucificação do contribuinte português, um impressionante trabalho de ante-visão do século XVII por Vouet)

Sem comentários:

Enviar um comentário

O autor deste blog arroga-se o direito de eliminar quaisquer comentários de conteúdo insultuoso.